A cidade de Belo Horizonte é pouco conhecida fora do Brasil. Apesar de ser a capital do estado e a sexta maior cidade do Brasil, Beagá, como os cariocas a chamam carinhosamente, não possui belas praias ou arquitetura colonial que ajudem a colocá-la no mapa. Até recentemente, a cidade nem participava do tão aguardado carnaval brasileiro.
No entanto, o jovem Carnaval de Belo Horizonte rapidamente se tornou um dos mais populares do Brasil. O Carnaval deste ano (oficialmente de 27 de janeiro a 18 de fevereiro, com o pico das festividades de 9 a 14 de fevereiro) verá um número recorde de 5,5 milhões de pessoas celebrando nas ruas da cidade – um número consideravelmente maior do que a sua população residente. Manchetes, incluindo a superestrela internacional Anitta, também aparecem pela primeira vez, confirmando Beagá como o novo destino de Carnaval do Brasil.
Seria difícil enfatizar demais a importância do Carnaval no Brasil. O período de folia que antecede a Quaresma é celebrado em outros países, mas em nenhum outro lugar é realizado com tanto entusiasmo como no Brasil. O Carnaval também é um grande negócio: em 2023 contribuiu com mais de R$ 8.180 milhões (cerca de £ 1,3 bilhão) para a economia brasileira.
O Rio de Janeiro tradicionalmente capturou quase metade desse negócio e atraiu a maior parte dos turistas internacionais; seu Carnaval é o maior e mais extravagante do mundo. Cidades costeiras como Salvador e Recife também têm uma forte tradição carnavalesca, enquanto, mais recentemente, a maior metrópole do Brasil, São Paulo, emergiu como um importante destino carnavalesco.
Mas este ano, os brasileiros mais informados estão indo para Belo Horizonte.
Construída como cidade planejada há 127 anos, Belo Horizonte é a capital de Minas Gerais, estado famoso por suas tradições culinárias e aguardente de cana-de-açúcar. A cidade em si é conhecida por sua cultura boêmia e clima descontraído, mas o Carnaval é levado muito a sério aqui – blocos, ou bandas de rua, começam às 05h e continuam até o início da noite. Este ano, o número de blocos realizados ultrapassará o do Rio, e espera-se que seu Carnaval injete R$ 1 bilhão (£ 160 milhões) na economia local.
“Só em anos mais recentes é que Beagá surgiu como um destino popular para os carnavalescos”, lembra Marina Pisa, organizadora do popular bloco Pisa na Fulô, em Belo Horizonte. “As pessoas costumavam sair da cidade – estava deserta.”
Segundo Pisa, Belo Horizonte costumava celebrar o Carnaval quando a cidade foi fundada, no final do século XIX. Mas na década de 1980 os desfiles morreram por falta de recursos e juros, e só em 2009 o Carnaval aqui “renasceu”.
Natalia Becattini, musicista de um dos blocos da cidade, diz que esse renascimento foi um momento decididamente político. “Foi um processo político, uma rebelião de esquerda”, observou ela.
Fernanda Branco Polse integra o Truck do Desejo, bloco de Belo Horizonte criado para integrantes das comunidades lésbicas, bissexuais e trans. Segundo Polse, o carnaval de Belo Horizonte começou como parte de um movimento de protesto contra o ex-prefeito. Quando o prefeito proibiu o uso de uma grande praça da cidade como espaço festivo, os manifestantes ocuparam a área vestindo biquínis e portando alto-falantes. “Desde então tem sido um Carnaval de luta e resistência”, disse Polse.
Ironicamente, a prefeitura começou agora a se envolver no Carnaval – algo com que nem todos os blocos se sentem confortáveis. “É como se estivessem tentando se apropriar de um evento espontâneo e popular para padronizar de alguma forma o nosso carnaval”, disse Polse. Além de investir pela primeira vez em infraestrutura carnavalesca, o estado de Minas Gerais também gastou mais de R$ 6 milhões em publicidade em todo o Brasil com o slogan “Sinta-se em casa nas ruas de Belo Horizonte”. Num movimento provavelmente calculado para enfurecer os moradores do Rio e garantir que o anúncio se tornasse viral, o cartaz foi até colado em outdoors no metrô do Rio.
Mas a nova popularidade do Carnaval de Belo Horizonte entre os brasileiros hipster não é apenas o resultado de uma publicidade inteligente. Gustavo Jreige é o apresentador da Festa VHS, uma festa LGBTQ+ popular em São Paulo. Embora normalmente passe o Carnaval em São Paulo, este ano ele vai para Beagá. Jreige diz que Belo Horizonte ocupa um lugar ideal: é bem organizada, mas não excessivamente curada; e é grande, mas ainda não está muito bem estabelecido.
“Para fazer um bloco em São Paulo é preciso seguir muitas regras”, disse Jreige. “É bem organizado, mas muito rigoroso.” Em contraste, disse ele, os eventos fora dos desfiles do Sambódromo no Rio podem parecer excessivamente caóticos.
A maioria dos blocos que acontecem no Rio são organizados espontaneamente e podem ser encerrados pela polícia. “Quando estive lá em 2019, passei mais tempo tentando encontrar blocos do que realmente curtindo”, disse Jreige. Em Belo Horizonte, os blocos funcionam de acordo com um cronograma, mas não são tão restritos como seriam em São Paulo.
Embora Jreige tenha dito que o Carnaval de São Paulo se expandiu a ponto de “perder a essência”, o Carnaval de Belo Horizonte não existe há tempo suficiente para se tornar excessivamente arraigado ou comercializado. De acordo com Pisa, “até recentemente, ninguém vinha aqui, então ainda parece muito fresco”.
Dois outros fatores importantes para a popularidade de Belo Horizonte são o custo e a segurança. Em comparação com os já consagrados carnavais do Rio e de Salvador, chegar e ficar em Belo Horizonte ainda é relativamente acessível. E apesar de ser uma cidade com cerca de três milhões de habitantes, Belo Horizonte mantém uma vibração de cidade pequena. “É uma cidade jovem com uma história de migração do campo e isso reflecte-se nas atitudes amigáveis e acolhedoras das pessoas”, disse Becattini. Além disso, tem a reputação de ser uma das principais cidades mais seguras do Brasil. “Temos problemas de segurança, mas não é a mesma coisa que Rio ou São Paulo – somos menores e mais seguros, e isso torna os blocos mais confortáveis”, acrescentou.
Seu crescente significado cultural também é um atrativo. Jreige, que começou a organizar sua festa VHS em Belo Horizonte, disse: “As pessoas se acostumaram com a ideia de visitar Belo Horizonte por causa dos muitos festivais e eventos culturais que sediou este ano – é também o lar de muitas marcas novas e emocionantes. .”
“De qualquer forma, as pessoas são legais em Belo Horizonte”, acrescentou, “[e] no Carnaval, quando todo mundo está feliz, vai ser ainda melhor”.